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André Rocha

É hora do Flamengo entregar geração Zico à eternidade e seguir em frente

André Rocha

28/12/2015 09h41

Flamengo_1981_Mundial

Mais uma vez, o "Jogo das Estrelas" organizado por Zico há doze anos proporcionou uma tarde de nostalgia no Maracanã. Uma ótima ideia no final do ano que reúne artistas, jogadores aposentados e ainda na ativa e a renda sempre é revertida para quem precisa.

Novamente o Galinho saiu reverenciado pela torcida do Flamengo, sempre maioria neste evento. Aos 62 anos, quase 26 depois de sua despedida do futebol profissional.

Nada mais justo para uma rara combinação no planeta bola: revelado pelo clube, maior craque, maior artilheiro, mais vencedor, nunca jogou por outro time no país. Ainda um exemplo de profissional e de conduta humana.

A geração que conquistou os títulos mais importantes da história do Flamengo com Zico também não é simples de repetir: a maioria de jovens formados no clube, alguns com transição para o profissional mais segura, outros não. Que ganharam 'casca" com os títulos estaduais perdidos de 1975 a 1977. Maturidade para depois levar para a Gávea todas as taças possíveis à época.

"Um time de exceção", como ressaltou o Leovegildo Junior na entrevista para o livro "1981" que este blogueiro escreveu em 2011 com Mauro Beting, amigo e referência profissional.

Exceção. Até porque a distância do tempo não permite que seja modelo. Outro contexto, outra realidade. Por isso o Flamengo precisa, enfim, entregar à eternidade a melhor e mais vencedora reunião de craques de sua história e caminhar pensando no futuro.

Não mais a tentativa de resgatar o slogan "Craque o Flamengo faz em casa" com a esperança de revelar um novo Zico. Ou Junior, Leandro, Adílio, Andrade…

A espera pelo "Messias". Muito comum no Brasil que ainda crê no poder de uma só pessoa para resolver tudo. Seja presidente da república, de um clube. Ou o diretor de futebol Arthur Antunes Coimbra, que chegou em 2010 como o Salvador. Como se fosse entrar em campo com o vigor de 1981. Não podia dar certo.

O que vai funcionar é o Flamengo ter orgulho de sua história, homenagear seus heróis sempre que possível, mas pensar futebol em 2016. Na gestão financeira já o faz. Falta a estrutura e a compreensão de que o futebol mudou.

Aquele time foi vanguarda pela valorização da posse de bola, congestionamento do meio-campo e maior aproveitamento ofensivo dos laterais Leandro e Júnior. Mais ou menos, acabou influenciando o futebol que se jogou depois. No Brasil e até no mundo, através da lendária seleção de 1982.

Está na hora de voltar a ser referência, mas por um novo caminho. Mais profissionalismo, menos folclore e crença de que a camisa e a torcida vão fazer a diferença sempre. Ou os remanescentes daquela geração.

Repare: com exceção da Copa do Brasil de 2006, todos os títulos relevantes do Flamengo nos últimos 25 anos tiveram algum protagonista direta ou indiretamente ligado àquele time. Do veterano Junior no Brasileiro de 1992, passando por Carlinhos, interino no Brasileiro de 1983, efetivo na Copa União de 1987 e treinador na Mercosul de 1999. Até Andrade no Brasileiro de 2009 e Jayme de Almeida na Copa do Brasil de 2013.

Em todas essas conquistas, sempre há quem busque alguma semelhança com 1981. Seja na maneira de jogar, no espírito, na valorização da base…Referência única.

Chegou a hora de buscar outras. Mais atuais, entendendo que o esporte mudou muito de 2009 para cá no mundo e o Brasil, mesmo com atraso, vai seguindo. Como o Corinthians de Tite, antenado e vencedor.

Muricy Ramalho chega falando em novas ideias, em um novo mandato de Eduardo Bandeira de Mello, presidente que faz história por mudar a imagem do clube mau pagador, pela coragem de trabalhar a longo prazo, mesmo sem a certeza de seguir no poder. Falta acertar mais no futebol. Em campo.

Com gratidão eterna a Zico e seus companheiros. Respeitando e até ouvindo esses personagens. Mas buscando um modelo que forme um coletivo forte para escrever outras páginas gloriosas do time mais popular do país.

Sem o saudosismo das velhas tardes de domingo no antigo Maracanã. Ou guardando para o "Jogo das Estrelas". Mas com time forte, CT e um estádio para, de fato e de direito, chamar de seu. Seguir em frente. Ainda Flamengo.

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.