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André Rocha

Marcelo Oliveira e Jorginho, campeão e rebaixado. Quem merece mais crédito?

André Rocha

28/02/2016 21h59

No mundo ideal, um treinador é contratado pela visão de futebol que combina com a filosofia do clube e o trabalho é avaliado por uma temporada.

No Brasil a avaliação dos grandes times é jogo a jogo, numa máquina de moer carnes com imediatismo insano. A pré-temporada de quase 30 dias foi um pequeno avanço no calendário ainda inchado, mas a seqüência de jogos inviabiliza correções e ajustes mais profundos. Porque se cobra resultado no Estadual que deveria ser seqüência da preparação.

Mas essa realidade dura não pode ser bengala ou dogma em todos os casos para isentar os treinadores de críticas e garantir empregos. É preciso contextualizar sempre.

Jorginho chegou ao Vasco com a missão inglória de evitar o rebaixamento após um turno pífio no Brasileiro. Não conseguiu, por muito pouco. Em primeira análise o trabalho não atingiu a meta principal.

Mas a evolução no desempenho do cruzmaltino foi notável. Com a liderança de Nenê em campo, o time mais organizado fez returno digno e foi superior ao Corinthians no empate em São Januário que garantiu o título à equipe de Tite.

Equipe que compactou setores, mesmo num 4-3-1-2 em desuso e pouca qualidade no ataque,. Valorizou a técnica e a posse de bola no meio-campo sem perder a competitividade. Resgatou confiança e autoestima.

Também pelas dificuldades financeiras do clube, Eurico Miranda manteve a comissão técnica para 2016. Apesar da dependência do camisa dez veterano, o Vasco segue o trabalho aproveitando a base formada no Estadual, dando chance a jovens e resgatando peças consideradas descartáveis, como Eder Luís e Thalles.

Nada espetacular, mas o suficiente para lutar pelo Carioca que Eurico valoriza tanto. Principalmente vislumbrar uma campanha sólida na Série B para cumprir a obrigação. Se for levado a sério a longo prazo, pode evitar o "bate-volta" à primeira divisão desde 2013. Utopia? Talvez. Pensar 2017 por aqui parece o próximo século.

Por outro lado, a bola jogada tem que ser parâmetro para avaliar a seqüência do trabalho. Mesmo o pouco mais de seis meses de Marcelo Oliveira no Palmeiras. O cenário: técnico bicampeão brasileiro assumindo elenco numeroso, mas montado no início do ano passado, com Oswaldo de Oliveira. Sim, precisa de tempo.

O problema é a estagnação. Mesmo com uma conquista importante. Copa do Brasil, a primeira do treinador depois de três decisões com Coritiba e Cruzeiro. Em um clássico regional saturado de rivalidade. Com sorte no gol perdido por Nilson na Vila Belmiro. Também boa atuação na grande decisão no Allianz Parque, em disputa com o Santos mais emocional que tática ou técnica.

Mas ainda sem progressos significativos. O time começou espaçado, sem controle do jogo, trocas de passes minimamente coordenadas e intensidade com inteligência para decidir no último terço do campo.

Em seis meses, com uma pré-temporada no meio e reforços pontuais para qualificar sem desmontar a base, pouco aconteceu. Ao menos uma melhora condizente com o tempo de trabalho era obrigatória.

Marcelo Oliveira não consegue entregar e nem parece encontrar um caminho. Já tirou Robinho do centro da articulação, puxou para o lado direito dando liberdade a Dudu – um dos poucos méritos nos muitos testes. Agora tenta alinhar o meia aos volantes para melhorar a saída de bola e proteger a defesa. Sai do 4-2-3-1 quase imutável para o 4-3-3 e até o losango no meio-campo, o mesmo de Jorginho no Vasco.

Mas a bola segue batendo e voltando. O time resolve rápido a jogada. Erra e cede espaços ao adversário, sofre muito quando precisa propor o jogo. Não é a derrota para a boa Ferroviária do técnico português Sérgio Vieira. Foi assim até na vitória sobre o Libertad no primeiro amistoso da temporada. Ou no empate fora de casa contra o River Plate uruguaio na Libertadores.

Eis o ponto. O Palmeiras de Marcelo Oliveira não evolui. Por isso o treinador precisa, sim, ser cobrado. Pelo que a equipe já poderia render agora. Mesmo sem um ano de trabalho e tempo para treinar. Porque não há indícios de que poderá render nos próximos seis meses.

Aqui não há defesa de demissão do profissional. Só que as dificuldades não podem garantir salvo-conduto e paciência eterna. O investimento é alto e mesmo sem grandes craques, o futebol do Alviverde podia ser melhor e o time mais organizado. Como o Vasco de Jorginho.

Sim, o técnico campeão contestado e o rebaixado com crédito. Porque a análise não pode se resumir a placares, tabelas e salas de troféus. O contexto é fundamental.

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.