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André Rocha

Afinal, um time depende do centroavante ou ao contrário? E o Flu de Fred?

André Rocha

10/04/2016 18h01

A história mostra que boa parte dos times e seleções que contribuíram para a evolução do futebol não contavam com a figura clássica do centroavante. O camisa nove que fica entre os zagueiros e está na área para definir.

Sindelar era um atacante móvel no Wunderteam nos anos 1930. Na Hungria de 1954, Hidegkuti vestia a nove, mas recuava para Kocsis e Puskas infiltrarem. Real Madrid de Di Stéfano, artilheiro que aparecia em todos os setores.

No Santos lendário, Coutinho era mais coadjuvante de Pelé, artilheiro em quase todas as competições no período áureo. O Brasil de 1970 com Tostão, um "ponta-de-lança" que mais adiantado abria espaços para Pelé e Jairzinho.

Holanda de 1974 com Cruyff rodando por todo o campo, Barcelona de Guardiola consagrando Messi como "falso nove". O São Paulo de Telê Santana, com Muller, Raí e Palhinha girando.

O Flamengo de Zico era um caso particularíssimo: Nunes era um típico centroavante, mas que naquela equipe se sacrificava procurando os flancos para participar da intensa movimentação. Sem protagonismo. Ou apenas nas grandes decisões.

Ronaldo, Romário e Van Basten. Centroavantes geniais. Ainda assim, em seus melhores momentos eram muito mais atacantes, participando da dinâmica ofensiva de seus times e seleções. Quando o físico não respondia, aí valia a incrível vocação para o último toque.

Sem deixar de depender do time. Eis o ponto. Se o centroavante precisa da jogada trabalhada para finalizar, no máximo colaborando no último terço e, dependendo da estatura, ajudando a retaguarda nas bolas paradas, ele precisa do trabalho coletivo.

Por outro lado, esse talento para ir às redes na maioria das vezes é o que define vitórias e títulos. Não por acaso faturam os maiores salários e os holofotes, desde a profissionalização do esporte. Como diz a canção do Skank: "O centroavante, o mais importante".

Com o estrelato, os goleadores tendem a pedir a bola o tempo todo e acostumar os companheiros a servi-los, mesmo melhor posicionados. Transferência de responsabilidade, assumida com prazer pelo nove, que também aceita a pressão quando a fase é ruim.

O centroavante depende do time, que vence com seus gols. Mas é possível prescindir dessa figura. As equipes mais modestas, sem tanto repertório técnico e tático, costumam precisar mais dos fazedores de gols. Mas sem ficar reféns destes.

Fred está na história do Fluminense. Por 2009 e 2012. Porque ficou mesmo com a saída da Unimed. Um ídolo inquestionável. Centroavante de exceção para o nível do futebol jogado no país.

Mas vive um paradoxo, porque é tratado como a referência da equipe, mas necessita do passe preciso. No Brasileiro de 2014 foi artilheiro em um time irregular, mas que criava na frente. No ano passado teve o melhor momento pouco antes da chegada de Ronaldinho. O Flu chegou a ser líder da principal competição nacional.

A relação custo/benefício, porém, não vem fechando em um clube sem o grande investidor de outros tempos. Pela gratidão, o atacante ganhou um poder que não deve ser conferido a um jogador. O dirigente, que também é torcedor, concede salvo conduto para qualquer comportamento. "Ele pode tudo".

Com Levir Culpi não costuma funcionar assim. Ronaldinho queria jogar sem treinar no Atlético Mineiro em 2014. Com aval da diretoria foi embora, mesmo com Libertadores e seu currículo de duas Bolas de Ouro. Diego Tardelli foi enquadrado, aceitou e viveu fase esplendorosa, com título da Copa do Brasil e convocações para a seleção brasileira.

Como será com Fred e essa rota de colisão? Sem ele, o Fluminense, que cresceu de produção depois da controversa saída de Diego Souza, venceu o Volta Redonda por 2 a 0. Lidera a Taça Guanabara e está na fase final do Estadual. Na Copa Sul-Minas Rio, perdeu o nove, expulso na estreia com derrota para o Atlético Paranaense, mas decide a primeira edição do torneio contra este mesmo adversário.

O futuro dirá quem é o dependente.

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.