É preciso entender, mas não aceitar, que empate com Equador não foi ruim
No futebol de seleções, a história mostra que as equipes mais vencedoras ou emblemáticas tiveram suas bases montadas em clubes fortes. Ou em ciclos mais longos, a ponto de ganharem entrosamento e maturidade. Há também as exceções, como a reunião de talentos extraordinários que fazem a diferença.
O Brasil hoje não tem nada disso. Por isso precisamos entender que não somos nem estamos os melhores. Acontece em todos os esportes. Mesmo o basquete americano, com os astros da NBA que parecem jogar em outra dimensão, tiveram um vexame em Atenas 2004.
Há hiatos. O brasileiro vem desde 2006, porque o futebol é bem mais cíclico que outras modalidades. O esporte mudou desde 2008, ficou mais coletivo, intenso, tático. Basta olhar para Messi e Cristiano Ronaldo, os dois protagonistas deste período, para perceber que nossos lampejos inconstantes de outros tempos não se sustentam mais.
Ficar preso às velhas tradições ajuda pouco. Como encarar a estreia na Copa América Centenário diante do Equador como se o adversário ainda fosse aquela seleção semiamadora de outros tempos e não a vice-líder das Eliminatórias, atrás do Uruguai apenas pelo saldo de gols. O Brasil é o sexto.
"Não existe temer o Equador", "tratá-los como favoritos é um absurdo!". Será? Um trabalho com base pronta, partindo do Emelec, inclusive o treinador Gustavo Quinteros, o melhor do país. Adicionando jogadores como Antonio Valencia e Jefferson Montero que atuam no campeonato inglês. Com Miller Bolaños, contratado pelo Grêmio para mudar de patamar na temporada.
O Brasil vem de um 7 a 1 histórico e traumático, não tem base, nem protagonistas experientes para sustentar a nova geração. Conta com um treinador com apenas dois trabalhos anteriores. Por isso contratado mais por motivos políticos que técnicos. O melhor, Tite, comanda o Corinthians. Para completar, Neymar, a estrela solitária, estava no Rose Bowl, mas na platéia curtindo férias com amigos. Fora os seis cortes do grupo original.
Não podemos ser favoritos. O retrospecto favorável nos confrontos e a camisa cinco vezes campeã mundial podem pesar e até pesaram. O Equador respeitou muito o oponente, mesmo com o bom início e o chute perigoso de Bolaños.
Depois permitiu que a seleção avançasse as linhas, trocasse passes ajudados pela melhor saída de bola de Casemiro e criasse oportunidades com Willian, Coutinho e Elias. Podia ter vencido.
Na prática, a derrota ficou mais próxima na segunda etapa com o chute de Bolaños, no qual a bola claramente não saiu inteira pela linha de fundo, e Alisson aceitou num frango que seria histórico e, pela lógica da comissão técnica com Jefferson, deveria render uma barracão. A arbitragem invalidou.
O empate sem gols não foi um resultado ruim. Pode acreditar. Por mais que machuque a nossa velha arrogância quando o assunto é futebol. Um ponto ganho diante da melhor seleção do grupo B.
Para a seqüência do torneio, o 4-1-4-1 pode e deve ser mantido. A seleção desfigurada precisa jogar de memória o máximo que for possível. Também arriscar mais, ter espírito de franco-atirador.
Antes é necessário entender que não é a favorita nos Estados Unidos. Porque a compreensão da própria realidade é o primeiro passo para não aceitá-la e tentar mudar o cenário. Ganhar confiança aos poucos. Ainda que tudo pareça utópico com um treinador sem cancha e conteúdo para a tarefa.
Vivemos uma transição complicada. Não é culpa da geração talentosa, mas entregue à sua própria sorte. Nem de Dunga, que nunca recusou uma convocação. A responsabilidade é de quem entregou uma dura tarefa que parece demais para sua capacidade na nova função.
O saudosismo é natural. Já cobrar dos jogadores atuais os feitos de Pelé, Garrincha, Gérson, Romário, Bebeto, Ronaldo e Rivaldo parece injusto. São histórias diferentes, construções de trajetórias com a camisa verde e amarela totalmente distintas.
O momento é de paciência, mudanças estruturais e uma nova mentalidade. Pensar como sempre só vai deixar as coisas como estão.
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