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André Rocha

Guardiola é revolucionário! Os "românticos" nunca existiram

André Rocha

04/11/2016 11h30

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Nos 3 a 1 do City sobre o Barcelona em Manchester, Pep Guardiola encontrou uma melhor resposta ao poder do ataque MSN, especialmente Lionel Messi. Menos posse de bola e troca de passes, mais intensidade e pressão na marcação do campo de ataque.

É lógico que os desfalques do time catalão ajudaram a complicar a saída de bola e a construção das jogadas. Iniesta, principalmente. Mas a leitura de jogo do treinador dos Citizens desta vez foi mais precisa.

Porque o "centro nervoso" do Barça atual é o ataque, diferente do time comandado por Pep, que tinha Xavi e o meio-campo, mais Messi como "falso nove", fazia o plano de jogo funcionar. Para evitar que a bola chegasse ao tridente sul-americano, linhas avançadas e muita concentração de Sterling, De Bruyne, David Silva, Aguero e até Fernandinho e Gundogan para roubar a bola na frente.

Com a vitória, a "descoberta" de um Guardiola competitivo, que acredita nas suas ideias e em seus princípios, mas é capaz de se adaptar para vencer. No Brasil, em geral, a visão é de que o técnico genial seria uma espécie de Telê Santana de 1982 que deu certo. Ou seja, a combinação de futebol arte e resultados.

Um "romântico". Alguém capaz de preferir ser derrotado a abrir mão de um estilo mais vistoso. A questão é que, na prática, este personagem é imaginário, nunca existiu. Pois quem chega ao futebol profissional e consegue alcançar equipes de primeira divisão ou seleções que chegam a uma Copa do Mundo são competidores natos.

Telê Santana perdeu para a Itália com os dez jogadores no campo de defesa no momento do terceiro gol de Paolo Rossi e, no último ataque, quase empatou num chuveirinho de Éder na cabeça de Oscar que parou nas mãos de Dino Zoffi.

Assim como Rinus Michels também apelou para o abafa com cruzamentos seguidos buscando o gol salvador da Holanda contra a Alemanha na final em 1974. César Luis Menotti? Um idealista, sim. Mas aceitou tudo e vibrou com a conquista argentina em 1978, até hoje cercada de suspeitas.

Mesmo treinadores mais radicais, como Marcelo Bielsa, Paco Jémez, Juan Manuel Lillo, Zdenek Zeman e, no Brasil, Cilinho, Edu Coimbra e hoje Fernando Diniz também querem suas equipes competitivas, ainda que acreditem em suas filosofias. É natural.

Guardiola não preferiu ser derrotado pelo Barcelona nos dois duelos no Camp Nou com Bayern e City. Simplesmente escolheu uma estratégia que não funcionou: criar superioridade no meio-campo para evitar que a bola não chegasse a Messi, Suárez e Neymar.

Na terça foi pragmático, com estilo simples e direto. O objetivo: três pontos que eram fundamentais. Assim como no próprio Barcelona lendário chegou a enviar o zagueiro Piqué para o comando do ataque e despejou bolas na área contra os "ônibus" de José Mourinho na Internazionale em 2010 e Roberto Di Matteo pelo Chelsea em 2012 nas derrotas pelas semifinais da Liga dos Campeões.

Também apelou para seguidos cruzamentos para Lewandowski e Muller até virar o jogo com o Bayern de Munique sobre a Juventus pelas oitavas-de-final do torneio continental na temporada passada. Guardiola quer vencer. Simples assim.

A diferença é que sua proposta de jogo é revolucionária por atualizar e combinar conceitos dos últimos 40 anos. Essencialmente quer a bola. Exige qualidade na saída para instalar seu time no campo de ataque. Troca passes para afastar o oponente do seu campo e inicia a pressão assim que perde a bola para não ser tão atacado.

Tudo para esgotar e nocautear o adversário sem piedade. Se tudo isso for possível com beleza, melhor. Eterniza os feitos, aumenta a satisfação. É da natureza humana tentar fazer bem feito e buscar o belo.

Mas quem tem 21 títulos em sete temporadas completas e só perdeu uma liga nacional na carreira, para o Real Madrid em 2011/12, não pode ser alguém que abra mão de vitórias. Guardiola cobra excelência de seus comandados, é obsessivo na ideia de jogar bem para ganhar três pontos. Pragmático na medida certa.

Não um "romântico". No mundo real eles nunca existiram.

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.