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André Rocha

Eduardo Baptista começa a entender na prática o Palmeiras que tem nas mãos

André Rocha

21/03/2017 11h28

No automobilismo, a combinação do melhor carro com o melhor piloto costuma terminar em provas e campeonatos vencidos de ponta a ponta – talvez com a trágica exceção da parceria Senna-Williams em 1994.

Mas a melhor máquina também pode fazer a diferença, mesmo numa disputa parelha. Mais velocidade na reta, estabilidade nas curvas. Mesmo para um piloto inexperiente, mas com potencial.

Eduardo Baptista assumiu o Palmeiras como o maior desafio de sua carreira. Com a sombra incômoda de Cuca, que não foi para outro clube e sempre haverá a fé de que a qualquer momento ele pode mudar de ideia e voltar à labuta.

Ganhou de presente o elenco mais forte da América do Sul, ao menos no papel. Mas também a obrigação de montar rapidamente uma equipe difícil de ser batida, com autoridade diante de adversários mais frágeis.

O técnico podia manter a ideia de Cuca inicialmente e inserir aos poucos os novos jogadores e só mais tarde acrescentar sua visão de futebol. Mas teve a coragem de fazer tudo ao mesmo tempo.

Não é fácil. Não seria para qualquer treinador. Mesmo Tite, o nosso melhor "piloto" que está na CBF. Mas o jovem técnico encarou o desafio. Com apenas três anos de carreira e só cinco meses e 26 partidas pelo Fluminense, único time do eixo Rio-São Paulo que comandou. Em um ambiente caótico nas Laranjeiras.

Com conhecimento e convicções colocou em prática uma transformação no modelo de jogo que não é simples. O time de Cuca fazia marcação individual, não prezava a posse de bola e definia rápido a jogada, de preferência roubando no campo de ataque.

Baptista quer o bloqueio por zona e jogadas mais trabalhadas, com inversão de jogo e aceleração no último terço do campo. Tudo isso com uma pré-temporada ainda curta e exigência de resultados já no estadual, que devia servir como laboratório.

O resultado prático é um time "híbrido". Num 4-1-4-1 que marca por zona, coloca a bola no chão. Mas quando precisa do gol para construir o resultado num cenário de grande pressão, parte instintivamente para os cruzamentos e consegue ser mais efetivo quando rouba a bola no campo adversário.

As oscilações são naturais. Mas com tempo e o respaldo de Alexandre Mattos e da diretoria, vai descobrindo que tem um grupo de atletas não só qualificado, mas também versátil.

Já trabalhou com Dudu, o grande destaque individual até aqui, nas pontas e também atrás do centroavante numa variação para o 4-2-3-1. Zé Roberto pode ser lateral ou meia. Willian "Bigode" já jogou como referência, mas foi na ponta esquerda que marcou o gol da virada sobre o Santos na Vila Belmiro. Jean, autor do primeiro gol, é volante já adaptado à lateral direita.

Há o mérito também de manter todos motivados. Roger Guedes perdeu espaço para Michel Bastos e Keno, mas quando entra é capaz de mudar o jogo aberto pela direita. Egídio também aceita a reserva de um jogador de quase 43 anos porque sabe que vai entrar em campo muitas vezes. O mesmo com Edu Dracena, que vai dando conta de substituir Vitor Hugo, também pode entrar na vaga de Mina quando este estiver na seleção colombiana e agrega experiência.

Eduardo segue no fio da navalha. As vitórias na semana não terminaram por detalhes em empate com Jorge Wilstermann e derrota para o Santos. A vibração do técnico nos gols transmite mais alívio que alegria.

Por ora os resultados vão avalizando o desempenho que não precisa chegar ao auge agora – e ainda não tirou o melhor de Felipe Melo, Guerra e Borja, as principais contratações. Ainda assim, é líder do grupo 5 da Libertadores e melhor campanha do Paulista.

Porque o técnico começa a entender, na prática, o Palmeiras que tem nas mãos. Nem o "Real Madrid dos trópicos", nem uma máquina voadora da F-1. Mas o melhor "carro" dos campeonatos que disputa e só precisa de ajustes para ser imponente na hora certa.

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.