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André Rocha

Eduardo Baptista já assumiu demitido, esmagado pela sombra de Cuca

André Rocha

05/05/2017 00h30

A sucessão de Cuca no Palmeiras era uma das mais complicadas da história do futebol brasileiro. Saiu campeão, idolatrado porque o time com sua cara deu o título que o clube sonhava há tempos. Ainda chegou no ano passado durante a disputa da Libertadores e deixou a impressão de que poderia ter ido mais longe se contasse com o treinador desde o início.

Sem contar o estilo particularíssimo de comandar, com práticas pouco usuais combinando com convicções antigas adaptadas ao futebol atual. Um jogo "maluco" que cativa o torcedor médio pela intensidade e entrega. Basta ver o "Galo Doido" que perdura desde 2013, seja lá qual for o comandante no Atlético Mineiro.

E o pior: não saiu para outro clube. Parou por tempo indeterminado. Sem marcar data de volta. Um paralelo na música seria o "hiato" da banda Los Hermanos em 2007. Não terminaram, mas cada um tomou o seu caminho. Eventualmente voltam. E os fãs sonham com o retorno para um trabalho inédito.

O palmeirense sonha com a volta de Cuca desde o anúncio de sua saída. Por isso Eduardo Baptista já estava demitido no anúncio de sua contratação. Pelo currículo de jovem técnico sem grandes conquistas. Pelo perfil mais alinhado aos conceitos atuais, que acarretaria uma mudança na forma de jogar. Para os mais fanáticos, até por ser filho de Nelsinho, com história mais ligada ao Corinthians como treinador.

Só seria possível sobreviver com uma mistura convincente de desempenho e resultados. Aquele momento mágico em que tudo se encaixa praticamente num estalo. Reforços adicionados à base mantida que entenderiam rapidamente as ideias do comandante e as características dos atletas se combinando ao natural. Algo raríssimo. E improvável.

Não podia dar certo. E errou quem contratou. Porque precisava de tempo para os jogadores acostumados com perseguições individuais se habituarem à marcação por zona. Para o jogo vertical se transformar em uma proposta que valoriza a posse de bola. Para os contratados se entrosarem dentro e fora de campo.

Só que não havia paciência em um ambiente de pressão insuportável, cobrando futebol do elenco mais qualificado do país como se fosse uma questão de distribuir camisas e "faça-se a luz!" Em quatro meses. Sem direito a tropeços.

O Palmeiras de Baptista escorregou. No Paulista contra a Ponte Preta. Na Libertadores diante do Jorge Wilstermann. Sim, houve oscilações e hesitações. A inexplicável opção por três zagueiros de ofício no primeiro tempo em Montevidéu contra o Peñarol.

E aí veio a explosão que se parte de um Abel Braga ou de um técnico mais tarimbado seria vista como um desabafo emocionado. Depois do impacto inicial, os gritos na coletiva no Uruguai foram tratados como a prova de desequilíbrio do jovem comandante. E para o Palmeiras e os palmeirenses é pouco.

A história do clube é pontuada por Oswaldo Brandão, Telê Santana, Luxemburgo, Felipão. Que já chegam campeões ao clube. Com estofo para suportar as cornetas e amendoins. Ainda que a tentativa com o Muricy Ramalho tricampeão brasileiro em 2009 tenha sido traumática.

Eduardo não resistiu. Como a passagem conturbada pelo Fluminense é um sinal de que será preciso recomeçar. Talvez em um clube de menor apelo, sem o peso de investidor milionário, sem a obrigação de resposta imediata.

Para o Alviverde Imponente, resta Cuca. Se ele não quiser de novo, o jeito será procurar outra grife. Ou alguém com perfil semelhante ao do técnico campeão brasileiro. Ou um treinador com história no clube, ainda que como jogador. Um símbolo.

Para não ser moído pela exigência altíssima, talvez desproporcional. Baptista nem moído foi, mas esmagado pela sombra de Cuca.

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.