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André Rocha

Rogério Ceni e São Paulo: reféns um do outro

André Rocha

27/06/2017 10h44

Já está virando rotina: na saída do estádio, jogadores do São Paulo são hostilizados, também dirigentes e o presidente Leco. Só o treinador continua preservado.

Comandante do time eliminado no Paulista, na Copa do Brasil, na Sul-Americana – vexatoriamente contra o minúsculo argentino Defensa y Justicia – e está na última posição antes do Z-4 no Brasileiro. Apenas 52% de aproveitamento na temporada, incluindo os jogos contra pequenos no estadual que costumam mascarar os números.

Tudo isto em um dos clubes mais vencedores do país que vive uma seca de conquistas desde 2012. Qualquer profissional em sua primeira experiência na carreira já teria sido defenestrado e, se morasse na mesma cidade, não sairia na rua sem ser ofendido. Menos Rogério Ceni.

Porque no Brasil, mais uma vez, se confunde o ídolo e o iniciante. O mito e o inexperiente. É assim na carreira de treinador, dirigente, comentarista. "Ah, ele sabe tudo de futebol!" Será? Em qualquer função?

Rogério Ceni começou fiel às suas ideias e ideais. Depois, como mesmo disse, descobriu que os números que valem para a maioria da torcida e da imprensa são os do placar final. Hoje sua equipe não tem cara. É um Frankenstein das ideias de suas referências: Sampaoli, Osorio, Muricy, Autuori…

Deixou de ser envolvente e intensa no ataque, mas não ganhou solidez defensiva a ponto de se tornar mais competitiva. Vive de espasmos, com momentos mais longos de posse estéril e linhas espaçadas.

Personalidade forte e exigente, não lida bem com os equívocos de seus atletas. Também tem dificuldades de reconhecer seus erros e os méritos dos adversários. Nas coletivas parece viver em um mundo paralelo, de derrotas e empates sempre injustos.

A pior notícia para ele é que começando pelo clube com o qual é mais identificado, uma saída fecharia as portas para praticamente todos os times grandes do país. Até pela imagem que construiu, muito fiel ao São Paulo e pouco simpática aos demais, não só aos rivais locais.

A questão interna é ter coragem de demitir o maior ídolo. De novo a mistura das funções. Há dois enormes complicadores: não existe um nome de consenso disponível do mercado e, como Ceni é principiante, não há uma referência anterior para identificar a possibilidade ou não de crescimento no médio/longo prazo. Ou seja, um enorme ponto de interrogação.

O São Paulo segue contratando, dispensando, testando. Fazendo a parelha Série A brasileira de laboratório. À espera da fórmula mágica. Ou de um milagre. O clube é refém de seu técnico-mito, que não tem outra opção a não ser tentar até o limite. Qual será?

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.