Sampaoli chega ao Santos no pior momento para trabalhar no Brasil
Numa entrevista em 2009, Andrés D'Alessandro se deixou levar pela irritação ao ser alvo de críticas da imprensa gaúcha por atuações irregularidades pelo Internacional e soltou uma daquelas verdades inconvenientes. Óbvia, mas que muitos preferem varrer para debaixo do tapete: "se atuasse bem sempre estaria na Europa, não no Brasil".
O argentino Jorge Sampaoli viveu seu auge comandando a seleção chilena. Uma sucessão lógica de Marcelo Bielsa, seu grande mestre, depois de ótimo trabalho na Universidad de Chile. Campeão da Copa América em 2015, citado como um dos melhores treinadores do mundo…foi parar no Sevilla.
Na principal liga do planeta, disputando muitas vezes em igualdade com os gigantes Barcelona e Real Madrid, parecia ter mudado definitivamente de patamar. Mas uma oscilação na Espanha e o convite para tentar tornar competitiva a seleção argentina para a Copa do Mundo na Rússia fizeram Sampaoli dar nova guinada na carreira.
A escolha se mostrou equivocada, já que seus trabalhos precisam de tempo para implementação e consolidação. A fidelidade aos conceitos e princípios exige processos que não podem ser tocados à forceps ou no improviso. Em nenhum momento dos 12 meses na AFA a albiceleste teve algo próximo do seu estilo. Desempenho ruim em amistosos, campanha pífia no Mundial com vaga no apagar das luzes da fase de grupos e eliminação nas oitavas para a França.
Agora o Santos, sucedendo Cuca. Primeira experiência no futebol brasileiro depois de anos de sondagens de grandes clubes. Justo no momento em que a onda mudou e treinadores estrangeiros e com status de "modernos" perderam a aura de solução.
Exatamente porque por aqui não há paciência sequer para o profissional aprender o idioma a ponto de garantir uma comunicação que torne o contato mais próximo. Sampaoli gosta de atuar com a defesa adiantada, posse de bola agressiva, rodízio no elenco e mudança no desenho tático de acordo com o adversário. Tudo que Rogerio Ceni, fã confesso do argentino, tentou no São Paulo, clube do qual é considerado o maior ídolo, e não conseguiu.
Vivemos a era de um jogo mais funcional, de fácil assimilação e simples execução. Ninguém quer o protagonismo para não cair na armadilha de ter a bola, perdê-la e ser derrotado pelo espaço que não teve atacando e cedeu para as transições ofensivas rápidas do oponente. Os clubes querem os "malandros", não os "teóricos".
Ainda que um típico profissional vindo da universidade como Tiago Nunes tenha dado um choque de realidade no Athletico "lúdico" de Fernando Diniz, um ex-jogador. O confronto é de ideias e ideais, não de origem. O foco é no resultado puro e quem chega com discurso sobre modelo de jogo ou qualquer coisa que simbolize algo mais elaborado já é tratado com preconceito. "Não é para nós", dizem.
Sampaoli chega com pouco tempo para trabalhar na pré-temporada e as cobranças típicas do nosso imediatismo. Junte a isso uma certa "resistência" com estrangeiros de parte da torcida e da imprensa – sem contar o olhar enviesado dos colegas brasileiros, sempre com um pezinho na reserva de mercado – e temos um cenário bastante complexo para ele. Mesmo que a festa no aeroporto sinalize otimismo e tolerância.
O treinador argentino deve ter ciência do terreno em que está pisando. A questão é se vale a aposta no futebol brasileiro neste momento de reconstrução da carreira. Ainda que, como D'Alessandro, ele saiba que não há espaço no momento para se aventurar de novo em um grande centro, o Santos é um enorme desafio. Com chances igualmente grandes de dar muito errado.
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