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André Rocha

Cabeça erguida é a grande vantagem de Neymar sobre Vinícius Jr. e Malcom

André Rocha

08/02/2019 01h51

Foto: Pau Barrena/AFP

Os grandes destaques de Barcelona x Real Madrid pela semifinal da Copa do Rei foram brasileiros: Vinicius Júnior deu belo passe para Benzema servir Lucas Vázquez no gol merengue e Malcom foi às redes empatando e salvando o time catalão. Ofuscaram a todos, inclusive Messi, que entrou no segundo tempo e pecou pelo individualismo na maioria dos lances, e Philippe Coutinho, novamente com desempenho abaixo de suas capacidades.

Não só pelos lances capitais. Participaram colocando velocidade e criando problemas para o português Semedo e também para Marcelo em duelos bem definidos com as equipes atuando no 4-3-3. Em times com forte trabalho coletivo, os jovens ponteiros eram os escapes, as referências de aceleração e também de uma mudança na rotação do jogo. Dribles para fora buscando o fundo ou para dentro batendo com o pé trocado. O destro Vinícius pela esquerda e o canhoto Malcom à direita.

Impossível não lembrar de Pep Guardiola elogiando Douglas Costa no Bayern de Munique, mas deixando claro que sua função seria basicamente a mesma que o alemão Leroy Sané executa hoje no Manchester City: o ponteiro que aguarda a bola no jogo de posição, normalmente em inversões, para interferir em dois toques: um "tapa" para fora e em seguida o cruzamento ou finalização.

Não é por acaso que os treinadores dos principais centros costumem optar pelos pontas brasileiros para missões bastante específicas. Explosão, mudança de direção e rapidez para dar profundidade aos ataques. Mas sem tanta participação coletiva. Porque os demais normalmente levam vantagem na leitura completa do jogo.

Vinícius Júnior e Malcom poderiam ter se destacado ainda mais no maior clássico espanhol e do planeta se não tomassem as decisões sem olhar o todo, erguer a cabeça. Ambos desperdiçaram bons contragolpes com opções limpas de passe para a conclusão. No gol de Malcom, a bola resvalou em Carvajal e entrou, mas podia ter saído. Quando Vinícius foi menos afobado encontrou Benzema às costas de Jordi Alba e seu time foi às redes.

Podem evoluir com o tempo, obviamente. Não só pelos três anos a menos, mas Vinícius, com 18 anos, parece ter mais lastro e também ser capaz de mais lances espetaculares. Ambos, porém, carecem de refinamento no acabamento das jogadas. Tomar a melhor decisão e executá-la com precisão. De todas as promessas brasileiras, a que parece ter mais técnica e inteligência é Rodrygo, ainda que seja menos desequilibrante nas jogadas individuais.

Acima de todos ainda está Neymar. Aos 18 ou aos 21 já sabia antever os movimentos e levantar a cabeça para mirar o gol ou um companheiro melhor colocado. Óbvio que a primeira temporada no Barcelona em 2013 não foi fácil pela necessidade de se adaptar ao modelo de jogo do clube, num período complicado sob o comando de Tata Martino. Mesmo com visão de jogo não era fácil pensar coletivamente quando desde sempre foi ensinado a partir para cima e resolver sozinho.

Aos 27, Neymar é mais armador, pensa melhor as jogadas. Na seleção ainda peca por achar que precisa definir todas. Uma espécie de retorno ao nosso futebol tantas vezes visto como tênis ou qualquer esporte individual. Mas mesmo quando dribla ele percebe o entorno. É o que falta a Vinicius e Malcom. Talvez desenvolvam com o tempo e construam carreiras até mais gloriosas, mas provavelmente faltará a chama do craque genial. Do diferente. Do que faz sem conseguir explicar. Simplesmente sabe. Neymar sabe, mesmo sem compreender outras tantas coisas fora de campo. Imagine se entendesse…

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.