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André Rocha

Dudu no Palmeiras lembra Maradona: precisa de um time para chamar de seu

André Rocha

16/02/2019 07h27

Foto: Ale Cabral / Agif / Estadão

Dudu renovou contrato com o Palmeiras até 2023 e nas suas últimas declarações públicas tem deixado claro que não pretende deixar tão cedo o clube. Jogar na Europa não o seduz. "Se vier um Barcelona ou Real Madrid vão ter que penar para me tirar daqui", afirmou em entrevista recente.

Pode soar como desdém a algo que provavelmente não vai acontecer, mas faz sentido. O atacante eleito melhor jogador do último Brasileirão tem alto salário, um clube estruturado e status de estrela pela história construída desde 2015, com participações decisivas na Copa do Brasil do mesmo ano e nos títulos brasileiros de 2016 e 2018.

Justamente nas equipes de Marcelo Oliveira, Cuca e Luiz Felipe Scolari é que Dudu encontrou um time para chamar de seu. Algo que não achou em Cruzeiro, Coritiba, Dinamo de Kiev e Grêmio. Talvez o "chapéu" que o Alviverde aplicou em Corinthians e São Paulo para contratá-lo tenha criado uma relação de carinho logo de início. Uma vontade de dar certo para esfregar na cara dos rivais.

Funcionou sempre que o Palmeiras dependeu de Dudu. Como meia central ou segundo atacante em 2015, compensando a ausência e depois a queda de produção de Gabriel Jesus no ano seguinte e em 2018 com Felipão armando o Palmeiras, independentemente da escalação, em função dele. Poupando o camisa sete menos que os demais.

Porque Dudu gosta de estar em campo, tocar na bola e se sentir importante. Seu jogo ganha volume, a confiança o estimula a arriscar. Com liberdade pode buscar o fundo pela direita ou o corte para dentro procurando a finalização ou o passe partindo da esquerda. Ou ainda infiltrando por dentro para fazer a diferença. Especialista em assistências, mas também o artilheiro do Palmeiras neste século com 56 gols.

Com a certeza de que é fundamental, Dudu até se acalma, reclama menos da arbitragem. O foco total é no jogo que precisa passar por ele. O que seria um enorme desgaste físico e mental para outros atletas é motivação que se retroalimenta. Ele precisa disso.

Quando o Palmeiras buscou um caminho de trabalho mais coletivo – com Eduardo Baptista e Roger Machado, por exemplo – o rendimento de Dudu não foi o mesmo. Porque ele não é jogador para esperar a bola na ponta ou se sacrificar taticamente como coadjuvante. Até executa as funções, mas perde a capacidade de desequilibrar.

Neste ponto lembra Diego Armando Maradona. Sem comparações, obviamente. A semelhança é apenas nesta necessidade de afago, de ganhar o time embrulhado para presente. Deixar claro que sem ele a chama se apaga.

Maradona já era uma estrela na base dos Argentinos Juniors e foi o craque da Argentina campeã mundial sub-20 em 1979, um ano depois do sofrimento por não ter disputado a Copa de 1978. Quatro anos depois, no Mundial da Espanha, César Luis Menotti encaixou o camisa dez na base campeã. Dentro de uma filosofia de jogo mais coletiva inspirada na Holanda de 1974, Maradona não brilhou. A despedida melancólica foi com um coice em Batista e a expulsão na derrota por 3 a 1 para o Brasil de Telê Santana.

Os grandes momentos vieram com Carlos Billardo em 1986 e 1990 e no Napoli. Como única estrela, ou a incontestavelmente mais reluzente. A sensação de carregar o time nas costas, com faixa de capitão e liberdade total, era o que movia um dos maiores e melhores jogadores de todos os tempos.

Dudu não é gênio como Diego, mas no coração carrega a mesma carência que produz maravilhas quando é suprida com o amor que o Palmeiras tem dedicado a ele. Em 2019 ainda está aquecendo as turbinas. Não foi bem na derrota para o Corinthians, muito pela falta de espaços, mas voltou a ser protagonista nos 2 a 0 sobre o Bragantino.

É ano para dar o salto buscando a sonhada Libertadores. Talvez uma convocação para a Copa América, apesar da forte concorrência nas pontas que agora ganha o nome de Vinícius Júnior. O problema é que com Tite, pelo contexto, Dudu seria mais um entre os convocados. Para ele não é suficiente.

Como Maradona, a química se dá com a dependência saudável, consentida. Uma combustão que só tem feito bem ao Palmeiras.

 

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.