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André Rocha

O "pecado original" do Barcelona na contratação de Philippe Coutinho

André Rocha

02/04/2019 09h12

Foto: David Ramos/Getty Images

Philippe Coutinho pode chegar ao final da temporada 2018/19 com a conquista da tríplice coroa pelo Barcelona. É líder do Espanhol, está na decisão da Copa do Rei e vivo nas quartas da Liga das Campeões contra o Manchester United. No melhor cenário totalizaria cinco títulos em uma temporada e meia no novo clube. O problema é que o brasileiro alcançaria este feito histórico sem o protagonismo esperado. Talvez até no banco de reservas.

Hoje a falta de confiança é clara, apesar das estatísticas nem tão ruins: dois gols e três assistências na Champions e três bolas nas redes pela Copa do Rei, além dos quatro gols e duas assistências em 17 jogos pela liga espanhola – dez entrando ao longo da partida. A tese de que precisa de um treinador com o espírito de Jurgen Klopp, seu último comandante no Liverpool, para colocá-lo para cima é válida. De fato o perfil mais sério e exigente de Ernesto Valverde não parece combinar com o jeito retraído de Coutinho.

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É preciso, porém, voltar ao momento da contratação para entender o que o clube catalão parecia desejar no encaixe do reforço de 130 milhões de euros, o mais caro da história do Barcelona.

Havia um consenso de que o time precisava de mais rapidez e intensidade na frente. Sem Neymar, Valverde inverteu o eixo ofensivo da equipe no início da temporada 2017/18: Dembelé entrou na ponta direita, com Messi centralizado atrás de Suárez e Iniesta fazia um híbrido de meia e ponteiro pela esquerda, abrindo o corredor para Jordi Alba descer. Contando com a cobertura de Umtiti e Nelson Semedo compensando como um lateral mais preso atrás, fazendo o balanço defensivo à direita.

A ideia de Ernesto Valverde para o Barcelona na temporada 2017/18 antes da chegada de Philippe  Coutinho (Tactical Pad).

Contratado na janela de inverno, Coutinho seria preparado para entrar na vaga que Iniesta deixaria ao partir para a aventura final da carreira no futebol japonês. Para ser exatamente esse "ponta-meia" que viveu seu melhor momento no futebol inglês jogando ao lado de Mané e Firmino e depois com o encaixe de Salah. Recebe pela esquerda, conduz, procura a tabela com o companheiro. Por dentro ou aberto combinando com o lateral. Ou inverte o lado da jogada. Ou, no melhor cenário, corta para dentro e finaliza.

O melhor cenário para Coutinho no Barcelona: recebe na meia esquerda, Jordi Alba desce atraindo a atenção da marcação e o brasileiro tem espaço para cortar para dentro e finalizar (reprodução Fox Sports).

Ele não é Iniesta, nem Neymar. Tem problemas no trabalho defensivo para ser um meio-campista no 4-3-3. No 4-2-3-1 sofre ao ficar de costas para a marcação e como um ponteiro agudo não dá profundidade aos ataques. A função de ponta articulador pela direita poderia até ser interessante  se não existisse Messi, que gosta de transitar justamente partindo daquele setor. Por isto Dembelé teve que mudar de lado.

O gênio argentino dava a impressão de que com o tempo mudaria seu posicionamento. Mais meia organizador que atacante. No entanto, a liberdade total fez muito bem ao camisa dez, dialogando com o meio-campo e fazendo dupla de ataque com Luis Suárez. Messi é cada vez mais o dono do time, armando e finalizando. Artilheiro e rei das assistências.

Protagonismo que acanha ainda mais Philippe Coutinho, que começou até bem, mas foi definhando na bola e no ânimo. Não por acaso, o Barcelona sinalizou na virada para esta temporada com as contratações de Arthur e Malcom que prefere um meio-campista organizador e capaz de cumprir as atribuições defensivas para dividir com Rakitic a função de proteger Busquets e um ponteiro agressivo para disputar posição com o oscilante Dembelé. Sem contar a versatilidade de Sergi Roberto, ora lateral, ora meio-campista.  Na variação do 4-3-3 para o 4-4-2 sem bola que beneficia Messi.

A tendência é o Barça tentar rever boa parte do que investiu no brasileiro ao final da temporada. É claro que Coutinho deveria ter menos dificuldades de adaptação a sistemas e ideias de jogo. Atrapalha seu desempenho, inclusive na seleção brasileira. O ideal também seria o jogador ter um plano de carreira mais consciente, sem pressa nem essa espécie de fetiche de brasileiros por atuar no Barcelona

Mas o "pecado original" do gigante europeu foi não avaliar criteriosamente quem estava contratando a peso de ouro. Coutinho ainda pode virar esse jogo, mas até aqui foi um "flop" na Catalunha.

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Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.