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André Rocha

As variações táticas e a leitura de jogo na grande vitória do Flamengo

André Rocha

22/08/2019 07h02

Foto: Thiago Ribeiro/AGIF

Jorge Jesus planejou detalhadamente o jogo mais importante do Flamengo até aqui na temporada. Desde o "blefe" na lista de relacionados e a escalação de Gabriel Barbosa até o desenho tático, desta vez com Willian Arão mais preso como volante num 4-2-3-1 e não um meia central no 4-1-3-2 habitual. Provavelmente para não expor Cuéllar contra as infiltrações de Edenílson e Patrick.

A opção por Bruno Henrique pela direita, Everton Ribeiro centralizado e De Arrascaeta, debilitado por um problema gástrico, à esquerda atrás de Gabriel Barbosa tirava um pouco de profundidade pelo setor de Filipe Luís, que não tem como característica chegar ao fundo com velocidade, e o uruguaio tendia a cortar para dentro. Sem contar a tensão pela importância do jogo e o respeito ao Internacional.

A equipe de Odair Hellmann veio no 4-1-4-1 costumeiro, com muita concentração sem bola, mas sem velocidade na transição ofensiva por conta da escolha por D'Alessandro e Rafael Sóbis pelas pontas e Paolo Guerrero na frente. Edenilson e Patrick novamente foram os motores, apesar do camisa oito nitidamente ter entrado no sacrifício, sem o vigor e a intensidade demonstrados na temporada.

Flamengo no 4-2-3-1 com volume de jogo, mas Arão mais preso e dificuldades para chegar ao fundo pela esquerda, Inter no 4-1-4-1 sem velocidade nos contragolpes com D'Alessandro e Sóbis pelas pontas e Edenilson no sacrifício (Tactical Pad).

Primeiro tempo de muita pilha errada, provocações, reclamações contra a arbitragem e um atleta que não queria jogar: Rodrigo Lindoso. Muita catimba e tempo gasto a cada falta sofrida. O Fla lutava para criar espaços, mas sofria com o forte bloqueio e a clara limitação física de Arrascaeta. Tentava compensar com muita pressão pós-perda da bola e chutes de fora da área de Everton Ribeiro e Bruno Henrique.

Na oportunidade mais cristalina, a jogada que seria um ensaio do que viria no segundo tempo: Filipe Luís, aberto pela esquerda, encontrou um bom passe por dentro furando as linhas de marcação encontrando Everton Ribeiro com liberdade. Passe para Gabriel e o chute mais perigoso que desviou em Moledo e Marcelo Lomba salvou. A melhor das seis finalizações rubro-negras, o dobro do Colorado – cinco a zero no alvo.

A entrada de Gerson na vaga de Arrascaeta mudou a dinâmica, mas também o desenho tático e, principalmente, a leitura de jogo da equipe de Jorge Jesus. Em um 4-4-2 com Gerson e Everton Ribeiro alternando pelos flancos e Gabriel e Bruno Henrique revezando no centro do ataque e na movimentação ofensiva.

Ainda a melhor atuação de Filipe Luís na volta ao Brasil. Sete desarmes, 58 passes certos e apenas dois errados. Uma aula de como fechar a linha defensiva e trabalhar como lateral construtor, atacando por dentro. No primeiro gol, o desarme em Edenilson, a saída limpa e o passe que clareou tudo para Everton Ribeiro pela esquerda. Lindo toque do camisa sete para Bruno Henrique, assistência de Gerson e gol do camisa 27.

Depois o lateral esquerdo achou Gabriel que serviu Bruno Henrique. 17º gol do artilheiro na temporada que constroi vantagem que só não virou uma quase certeza de classificação para as semifinais porque o camisa nove furou e não aproveitou a retribuição do companheiro livre na área depois de lindo lançamento de Gerson. Era a bola dos 3 a 0.

Porque o Flamengo aproveitou bem os espaços, também por conta da empolgação do Internacional quando Nico López e Wellington Silva entraram nas vagas de D'Alessandro e Sóbis e o time visitante cedeu mais espaços entre os setores. Talvez fosse o plano tentar matar o confronto no segundo tempo da ida fora de casa, mas a catimba acabou se transformando em ingenuidade.

Com Gerson na vaga de Arrascaeta e Bruno Henrique adiantado para o ataque com Gabriel, um Flamengo mais dinâmico e ofensivo que aproveitou os espaços cedidos pelo Inter depois das entradas de Nico López e Wellington Silva nos flancos (Tactical Pad).

E ineficiência nas finalizações. Foram nove, mas apenas duas no alvo. Nico López perdeu a grande chance no final em falha de Marí. Já o Fla foi o contrário do "arame liso" em jogos decisivos. Oito conclusões, sete na direção de Lomba e dois gols.

Saiu caro para o Colorado. Mas ainda reversível pela força da equipe gaúcha no Beira-Rio e a dificuldade que o Flamengo terá para escalar o meio-campo sem Arão, suspenso, e talvez Cuéllar, que pode ser negociado com o Al Hilal, da Arábia Saudita, ainda nesta semana. Mas a vitória no Maracanã com mais de sessenta e seis mil presentes foi enorme, ainda maior pelo histórico recente do clube carioca no torneio continental.

Com fibra, grito da massa e de novo o brilho de Bruno Henrique, mas também variações táticas e leitura de jogo para se impor em uma disputa que o Flamengo vinha fraquejando. Méritos de Jorge Jesus.

(Estatísticas: Footstats)

 

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.