A lenta agonia do Cruzeiro. O que Abel Braga foi fazer em Belo Horizonte?
Este blogueiro até evitou fazer qualquer análise sobre as possibilidades de Abel Braga no Cruzeiro logo depois do anúncio da contratação por conta da incredulidade com o acerto do treinador com o novo clube. Não só pela situação do time mineiro, mas principalmente pela prática quase ritualística de assumir trabalhos apenas no início da temporada. A última vez que aceitou um convite no segundo semestre foi no Fluminense em 2011, mas com promessa de trabalho a longo prazo – ficou até 2013 faturando os títulos carioca e brasileiro.
Abel falou em "dívida" na primeira coletiva, alegando que o Cruzeiro abriu as portas para ele, ainda jogador, em 1981 depois de dois anos no Paris Saint-Germain. Mas nas entrelinhas deu a impressão de aceitar o apelo de jogadores que comandou e com os quais foi vitorioso e criou amizades, como Thiago Neves e Fred. Também pode estar vendo o mercado de treinadores ficar mais restrito com a renovação e chegada de estrangeiros – Abel não foi a primeira opção da diretoria, que chegou a sondar Dorival Júnior e pensar em outros nomes.
Seja como for, o "fato novo" com impacto no vestiário e no campo depois da passagem conturbada de Rogério Ceni, já resgatando confiança e conseguindo resultados rapidamente, não aconteceu. Estreia um dia depois da apresentação com derrota para o Goiás por 1 a 0, depois empates com o Internacional (1 a 1), Fluminense (0 a 0) e o péssimo, frustrante com a Chapecoense por 1 a 1. Com gol sofrido aos 49 minutos do segundo tempo, de Camilo em lance difícil confirmado pelo VAR.
A transformação anímica não veio. Turbulência política, crise financeira, dirigentes sob investigação e confiança baixa também não ajudam, assim como a dívida estimada em 520 milhões de reais. A campanha é vergonhosa: apenas quatro vitórias, dez empates e onze derrotas. 19 gols marcados, 33 sofridos. Antepenúltimo colocado, já quatro pontos e três vitórias atrás do Ceará, 16º . Sem direito ao confronto direto nas 13 rodadas que faltam – empatou sem gols na despedida de Ceni.
O cenário já é desesperador. Porque a competição afunila e no caso do time grande, que nunca caiu, o peso é maior do que sobre os concorrentes. É possível se safar, mas terá que virar a campanha do avesso. Em 13 rodadas é preciso somar 23 pontos, um a mais do que alcançou em 25 partidas. Talvez a "nota de corte" fique abaixo dos 45. Mas a missão não parece das mais fáceis.
Menos ainda olhando para a tabela: já na próxima rodada pega em Belo Horizonte o redivivo São Paulo, de Fernando Diniz que com um Fluminense enfraquecido deu trabalho a Abel no comando do estelar Flamengo em todos os confrontos no Carioca. Agora os elencos, ao menos no papel, são equivalentes. E o momento do tricolor do Morumbi é bem superior.
Depois visita o Corinthians, recebe o Fortaleza em um confronto direto, sai para novo duelo de "seis pontos" com o Botafogo. Em seguida, Bahia no Mineirão, Athletico na Arena da Baixada, o clássico mineiro, Avaí em casa, Santos fora, CSA em Minas Gerais, visita o Vasco e o Grêmio em sequência para fechar a campanha contra o Palmeiras em casa. Difícil prever os pontos mais acessíveis, porque os confrontos também dependem dos cenários para os oponentes.
É claro que há nesta edição do Brasileiro quatro times para cair no lugar do gigante mineiro. Mas é difícil encontrar esperanças diante da falta de vitórias para quem precisa pontuar tanto. E a perspectiva do rebaixamento é ainda mais assustadora considerando a queda brusca nas receitas de TV. A gestão ficaria praticamente inviável.
Difícil abordar qualquer questão técnica ou tática. Sem tempo para treinar com dois jogos por semana e considerando que Abel mostrou no Flamengo que o conteúdo não está tão atualizado, a esperança era que a gestão de pessoas fizesse a diferença. Mas o discurso conhecido de "meu grupo tem caráter", "a gente resolve lá dentro do vestiário e aqui com vocês (imprensa) eu seguro" e outros clichês parece não ter o impacto de outros tempos.
Agora o time celeste precisa mesmo é de coordenação dos setores, dar menos trabalho ao goleiro Fábio e caprichar no acabamento dos ataques. Mas em momentos de pressão a perna "encolhe", o campo fica imenso e a meta adversária minúscula. Mesmo para um grupo de veteranos. Para piorar, não há orientação segura ou estratégia para dar um pouco de racionalidade ao caos.
O Cruzeiro agoniza lentamente. E este que escreve continua sem entender: que Abel foi fazer em Belo Horizonte?
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