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André Rocha

Flamengo precisa entender o tamanho que ganhou. Empate é título para rivais

André Rocha

14/11/2019 00h39

Aconteceu em Fortaleza, com o mosaico da polêmica de torcida local x nacional. Passou pelo Goiás no Serra Dourada com clima de final de Copa do Mundo. Sem contar a entrega com alguma violência do Botafogo no Nilton Santos e agora o Vasco jogando a vida, sem nunca desistir, depois da apatia completa em São Januário há sete dias contra o time misto do Palmeiras.

O maior adversário do Flamengo hoje é o ódio dos rivais. Natural contra o time de maior torcida, mas também pelos elogios da imprensa, a solidez financeira e administrativa, os acertos nas contratações, além do debate Jorge Jesus versus treinadores brasileiros.

Todo jogo é decisão para os adversários da equipe que chega a 24 jogos de invencibilidade na temporada, 20 no Brasileiro. O Flamengo precisa entender o tamanho que ganhou na temporada. A ponto do gigante São Paulo celebrar ter sido o único time da competição a não ser derrotado pelo líder.

No Maracanã parece ter desconcentrado com o gol rápido, antes do primeiro minuto, na arrancada de Reinier pela esquerda até a conclusão de Everton Ribeiro. A proposta agressiva, com última linha defensiva adiantada, necessita de intensidade na pressão pós-perda e sem ela os setores ficam espaçados e a defesa exposta.

Mas em outro contexto o rival se desmancharia com um gol sofrido tão rápido no estádio com maioria rubro-negra. Só que o Vasco é o maior expoente do ódio ao Flamengo. Não só pela rivalidade histórica, mas por um discurso sedimentado durante décadas pelo finado Eurico Miranda, que formou gerações e gerações de torcedores que parecem viver mais em função do rival do que do próprio clube. Muitos vibram mais com as derrotas do Fla do que com os triunfos do time de coração.

A raiva foi aditivada pela boa estratégia de Vanderlei Luxemburgo, usando Raul, Pikachu e Rossi ou Marrony para cima de Pablo Marí e Filipe Luís e, um pouco menos, Danilo Barcelos, Marcos Júnior e o atacante que ficasse no lado oposto do 4-4-2 vascaíno contra Rafinha e Rodrigo Caio. Assim construiu a virada em três minutos, com gols de Marrony – pegando a defesa sem Rodrigo Caio, que avançou aleatoriamente – e de Yago Pikachu, em pênalti sofrido – jogada espetacular contra Marí e Gerson! – e convertido pelo lateral.

O Flamengo teve mais sorte que juízo ao empatar no final do primeiro tempo com cruzamento de Rafinha que desviou em Barcelos e entrou. Na comemoração, a provocação do lateral a Edmundo, hoje comentarista que, quando da contratação do ex-Bayern de Munique, afirmou que ele era do mesmo nível de Rodinei e Pará.

Na volta do intervalo, o time titular do Flamengo voltou a se reunir com a troca de Reinier por De Arrascaeta, recuperado de torção no joelho. Mas a dispersão seguiu igual e, em nova jogada pela direita, o Vasco abriu 3 a 2 com gol de Marcos Júnior, livre na pequena área. Expostos e com muito campo para correr, Marí e Filipe Luís sofreram. Mérito de Luxemburgo, o primeiro a explorar com qualidade e eficiência um problema defensivo do líder do Brasileiro que ainda não tinha se notado.

O Flamengo voltou a se instalar no campo de ataque, mas empatou em contragolpe rápido: arrancada de Bruno Henrique, assistência de Arrascaeta e gol do vice-artilheiro do campeonato. Autor também do gol da virada, o décimo sétimo do atacante, em grande jogada de Vitinho, que substituiu Gerson e foi para a ponta direita empurrar o Flamengo ainda mais para frente.

Parecia que a segunda virada consecutiva no Maracanã estava consolidada. Jesus restabeleceu o equilíbrio no meio-campo trocando Everton Ribeiro por Piris da Motta. Poderia ter sacado Gabriel, que desta vez só mostrou vontade e errou muito tecnicamente, como quase todo time. Mas Everton vem jogando seguidamente e convive com uma tendinite.

O Vasco parecia sem pernas e a derrota nem faria tanta diferença na tabela. É aí, porém, que o Flamengo precisa ficar mais atento. A raiva, a indignação com mais um revés para o grande rival empurrou o time cruzmaltino para frente. Bola levantada na área por Bruno César, substituto de Marcos Júnior, mais uma falha defensiva do Fla e gol de Ribamar, que entrara na vaga de Marrony e já fizera Diego Alves trabalhar com bela defesa.

Quatro a quatro. Um resultado adequado ao que foi um jogo histórico. Prêmio à fibra inesgotável dos vascaínos. No final, confusão e um ambiente de guerra. Parecia final de campeonato. Nas arquibancadas, festa da torcida "visitante".

E deve ser assim nas próximas partidas da equipe de Jorge Jesus. Tudo para o líder será vendido muito caro. O Grêmio mordido pelos 5 a 0 na Libertadores também vai criar um clima hostil em Porto Alegre no domingo. Talvez seja essa a única esperança para o Palmeiras se agarrar. E, claro, também jogar a vida no confronto com os rubro-negros em casa na antepenúltima rodada, se ainda houver chances matemáticas.

Ao Flamengo resta um último esforço no domingo. Para enfim ter um período de descanso, recuperação e treinamento e disputar o título continental em Lima contra o River Plate. Quando voltar, com ou sem taça, será preciso retomar a concentração para confirmar a conquista nacional. Não será tão fácil quanto parecia. Porque empate para os rivais agora é título.

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.