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André Rocha

Por que Edmundo não deu certo no Flamengo em 1995?

André Rocha

19/05/2020 11h25

Foto: Acervo / Flamengo

Há 25 anos, Edmundo chegava ao Flamengo como a principal contratação do início da gestão Kléber Leite, depois da vinda de Romário. Recebido com festa e desfile em carro do Corpo de Bombeiros. Como não podia mais ser inscrito no Carioca e na Copa do Brasil, o atacante só poderia jogar o Brasileiro e a Supercopa Libertadores.

Nenhum problema para o presidente, nem para o treinador Vanderlei Luxemburgo. Embora a ambição no centenário do clube fosse conquistar todos os títulos, a conquista do Brasileiro era o principal objetivo, até para voltar a disputar a Libertadores. Por isso a contratação do técnico e do grande destaque individual do Palmeiras, bicampeão em 1993/94.

Só que a perda do estadual para o Fluminense, no lendário gol de barriga de Renato Gaúcho, fez explodir a crise de relacionamento entre Luxemburgo e Romário. E Kléber Leite deixou a corda estourar do lado do treinador, que não suportou a pressão de resultados ruins e a clara cisão no grupo. O melhor jogador do planeta em 1994, com a moral de campeão do mundo pela seleção, foi colocado naquele momento acima do clube e venceu a queda de braço.

Luxemburgo pediu demissão e o time foi ladeira abaixo. Não só porque Edinho não era o treinador para o momento que vivia o clube e o radialista Washington Rodrigues foi uma solução populista para acalmar a torcida, mas porque a autoridade de Romário transformou a gestão do futebol em uma bagunça generalizada.

Além disso, a sanha por contratações de Kléber Leite gerou uma reformulação no elenco que praticamente descartou a base que fizera a melhor campanha geral no Carioca – o Fluminense venceu o octagonal decisivo, mas o time rubro-negro conquistou a Taça Guanabara  – e foi semifinalista da Copa do Brasil, caindo para o forte Grêmio de Felipão que seria campeão da Libertadores.

O zagueiro Jorge Luiz, por exemplo, que havia feito um bom Carioca com gols e atuações destacadas foi um dos responsabilizados pelo fracasso no estadual  e partiu para o Atlético Mineiro. Para retornar no ano seguinte e ser um dos pilares do time campeão invicto do Rio de Janeiro.

Tudo ruiu sem Luxemburgo. Inclusive o encaixe de Edmundo no time. O treinador planejou e testou a equipe com três atacantes, colocando Mazinho, ex-Bragantino, como uma espécie de "dublê" da nova estrela. No jogo final contra o Fluminense errou ao trazer William de volta ao meio-campo. No segundo tempo, com Mazinho em campo, o Fla reagiu.

No plano de Luxa, Sávio seria adaptado como uma espécie de "enganche" em um 4-3-1-2 que teria Djair como a peça que faltou ao Fla no primeiro semestre e foi uma das chaves da reação do Fluminense de Joel Santana e Renato Gaúcho: o meio-campista organizador que faz o time jogar. O técnico rubro-negro tentou encaixar Válber e até Branco na função, porém sem sucesso.

Edmundo jogaria solto, se movimentando em torno de Romário, que ficaria mais fixo como centroavante. Não deu tempo e Luxemburgo e Edmundo sequer fizeram um jogo oficial juntos pelo Flamengo. "Interrompeu um projeto que poderia ter sido bem sucedido, todos saíram perdendo", lembrou Luxemburgo em entrevista anos depois.

Já Edmundo, que se transformaria em desafeto do treinador, culpa a desorganização do clube: "o marketing ficou maior que o futebol e nossas viagens eram uma farra, não era sério", afirmou em entrevista a Teo José para o Fox Sports, canal que tem o ex-jogador como comentarista.

Edinho montou um time engessado com Edmundo e Sávio nas pontas e Romário no centro e Washington Rodrigues "ganhou" uma suspensão de dois jogos do "Animal" pela famosa confusão com Zandoná em um jogo contra o Vélez Sarsfield, e ainda uma lesão: fratura do osso do pé esquerdo do camisa sete em disputa com o zagueiro Gamarra em Porto Alegre contra o Internacional, ficando de fora do resto da temporada.

Assim o "Apolinho", amparado pelo auxiliar e treinador Arthur Bernardes, pôde montar um time mais equilibrado e competitivo, com meio-campo preenchido, e ao menos chegar à decisão da Supercopa contra o Independiente. O título esperado, porém, não veio e a campanha no Brasileiro foi pífia.

A saída de Luxemburgo foi decisiva para o fracasso do Flamengo no ano do centenário.  O projeto de "melhor ataque do mundo" virou piada e Edmundo, que ainda se envolveu em um acidente grave que matou três pessoas e feriu outras três, partiria para o Corinthians. Mesmo com Joel Santana, então o treinador em 1996, pedindo sua permanência. Simplesmente não havia mais clima. O "casamento" tinha terminado.

Edmundo faria sua história no Vasco como grande algoz do Flamengo. Foi o que ficou para a eternidade e ganhou força ao longo dos anos com o agora comentarista sempre demonstrando seu amor pela Cruz de Malta. Mas não foi o coração cruzmaltino que atrapalhou o atacante no rival. Ele apenas foi o craque certo na hora errada. Por culpa da bagunça rubro-negra em ano histórico. Um desperdício.

 

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.