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André Rocha

Quebrar a saída "Lavolpiana" do Lanús pode ser atalho para o Grêmio

André Rocha

20/11/2017 12h01

Jorge Almirón, treinador do Lanús, foi jogador do Atlas comandado pelo compatriota Ricardo La Volpe, campeão mundial como jogador em 1978,  de 1997 a 2000.  Os argentinos fizeram história no México com um time que não ganhou títulos, mas ficou na lembrança por ser uma equipe jovem e de futebol vistoso.

La Volpe chamou mesmo atenção do mundo em 2006, comandando a seleção mexicana na Copa realizada na Alemanha. Bola no chão e uma maneira de sair da defesa com dois zagueiros bem abertos e Rafa Márquez centralizado iniciando a construção do jogo. Rafa que jogou com Almirón no Atlas de La Volpe.

A intenção é ter um jogador de passe qualificado para fazer a equipe jogar desde a defesa e se instalar no campo adversário através de trocas de passes. Normalmente com os laterais adiantados e abrindo o campo, os meios-campistas voltando para auxiliar na articulação e os atacantes mais próximos para se movimentar e abrir espaços.

Movimento que chamou atenção de Guardiola, encerrando a carreira no mesmo país, atuando sob o comando de Juan Manuel Lillo no modesto Dorados de Sinaloa e, lesionado, fazendo uma espécie de estágio com o treinador que até hoje trata como mestre. Também aprendeu, ou aprimorou, e levou para seu Barcelona lendário a saída de bola que ficou conhecida como "Lavolpiana".

Almirón também tem esse trabalho coletivo como base para o modelo de jogo do time que começa a decidir a Libertadores contra o Grêmio em Porto Alegre. É a equipe que mais troca passes na Libertadores, com cerca de 91% de aproveitamento no fundamento.

Na execução do 4-3-3 básico, que se converte naturalmente em 4-1-4-1 sem a bola, a saída é feita com os zagueiros Guerreño e Braghieri abrindo para o volante Marcone, melhor passador do torneio e um dos grandes destaques individuais do "Granate", retornar entre eles para iniciar o jogo.

O trio do Lanús na saída de bola, com o volante Marcone recuando e os zagueiros Guerreño e Braghieri abrindo e dando opções de passe (Reprodução Fox Sports)

Inspirado no que Guardiola fez no Bayern de Munique com Lahm e Alaba e agora realiza no Manchester City com Walker e Delph, os laterais Gómez e Velázquez podem atacar bem abertos para esgarçar a marcação adversária ou por dentro, criando superioridade numérica no meio, e os pontas Silva e Acosta abrindo o campo.

Toda essa dinâmica complexa, desenvolvida desde 2015 por Almirón, constroi um volume de jogo sufocante para o oponente. Uma vez ocupado o campo de ataque é difícil sair, pois é uma equipe entrosada, que joga "de memória" e inicia a pressão assim que perde a bola. Dentro ou fora de casa.

Por isso um dos atalhos possíveis para o Grêmio em sua Arena é exatamente evitar que esse passe saia "limpo" de trás. Quebrar essa saída. Com Luan, Barrios e até Fernandinho pressionando o trio da saída de bola. Especialmente sobre Marcone, que é o elemento facilitador.

Além de dificultar a construção do jogo, o contragolpe costuma ser letal porque pega o adversário um tanto descoordenado, com os zagueiros espaçados e sem defender a própria área, laterais e meio-campistas mais adiantados. A transição defensiva é o grande complicador deste processo se há um erro, desarme ou interceptação do rival. No caso do Lanús pode ser ainda mais danoso, já que em boa parte das ações o goleiro Andrada se adianta para participar como uma espécie de "desafogo".

Com Luan, Barrios e Fernandinho o Grêmio pode pressionar e complicar a saída "Lavolpiana" do Lanús e iniciar um contragolpe letal, com o adversário desarrumado (Tactical Pad).

Assim o Chile perdeu a Copa das Confederações para a Alemanha este ano. Pressão no volante Marcelo Díaz, que estava no meio dos dois zagueiros, bola roubada por Werner e gol de Stindl. O único da decisão. O Lanús enfrentou problemas com pressão do adversário no próprio campo contra a Chapecoense na fase de grupos. Bola roubada, saída rápida pela esquerda e o gol de cabeça de Wellington Paulista na vitória da equipe catarinense por 2 a 1, em Lanús. Contra o San Lorenzo na derrota por 2 a 0 no jogo de ida, o lateral Gómez quis sair jogando numa situação de pressão, perdeu a bola e cometeu pênalti convertido por Blandi no segundo gol.

Por mais personalidade e poder de recuperação que tenha demonstrado o Lanús até aqui, é uma final continental. Inédita para o clube de bairro da zona sul de Buenos Aires. O componente emocional deve ter forte influência e o Grêmio pode se aproveitar com intensidade e pressão, desde a saída de bola. "Lavolpiana" com Almirón, mas não perfeita. Uma bola roubada pode decidir a Libertadores.

(Estatísticas: Footstats)

 

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.