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André Rocha

Brasil empata na estreia como em 1978. Mas só não venceu sofrendo em 1994

André Rocha

17/06/2018 18h32

A primeira observação sobre o empate por 1 a 1 na estreia da Copa do Mundo 2018 é que havia um adversário do outro lado. Algo óbvio, mas que no Brasil costuma ser desprezado. Empatamos ou perdemos sempre para nós mesmos, nunca há mérito do adversário.

A Suíça tem base consolidada, entrosamento e jogadores interessantes como os laterais Lichtsteiner e Rodríguez, o meio-campista Xhaka e Shaqiri, ponta canhoto cortando da direta para dentro que criou problemas para Marcelo, Casemiro e Miranda com sua movimentação. Fez atuação correta e aproveitou os erros brasileiros.

Equívocos técnicos provocados nitidamente por ansiedade, pressão por vitória. Inevitável depois de um 7 a 1 em casa. Mesmo com a transformação sob o comando de Tite. A Copa muda os parâmetros e a seleção sentiu.

Mesmo com um bom começo, de volume de jogo interessante e o lado esquerdo forte ofensivamente. Como no gol de Philippe Coutinho, com a bola indo e voltando ao setor até a bela finalização do camisa 11, o meia por dentro ao lado de Paulinho no 4-1-4-1.

Mas surpreendentemente oscilou no segundo tempo em um mantra de Tite desde o Corinthians: concentração. Inclusive no gol da Suíça. A disputa entre Zuber e Miranda era passível de falta. Este que escreve não marcaria, mas a reclamação é aceitável. Houve, porém, um descuido geral. Mais uma vez na bola aérea.

Depois foi ansiedade. Melhorou a produção no meio com Renato Augusto no lugar de Paulinho. Casemiro vinha bem, mas saiu por conta do amarelo e do risco de vermelho na cobertura de Marcelo contra Shaqiri. Fernandinho, outro personagem dos 7 a 1, foi outro a demonstrar nítida ansiedade. Firmino que entrou no lugar de Gabriel Jesus foi mais um a esbarrar na afobação. Péssimo aproveitamento coletivo nas finalizações: quatro no alvo de 20.

E Neymar foi um contraponto a esta eletricidade. Por isso a incógnita sobre sua condição física na primeira partida oficial depois de três meses. Em seu estado normal, Neymar partiria para cima, talvez até atrapalhasse o time com individualismo e irritação. Ainda mais sofrendo dez das 19 faltas cometidas pelos suíços. Mas pareceu um tanto passivo e preocupado. Ora com mão na panturrilha, ora fazendo cara feia como se sentisse o pé. Estranho…

É a primeira vez que várias gerações veem o Brasil não vencer em uma estreia de Mundial. A última foi em 1978, o famoso jogo em que o árbitro encerrou a partida quando Zico completou uma cobrança de escanteio. Também 1 a 1 com a Suécia. Depois só vitórias. Mas quase todas com sofrimento.

Em 1982, 1986 e 2002 precisou do "apito amigo". Pênaltis não marcados contra a União Soviética na Espanha, gol mal anulado da Espanha no México e pênalti "maroto" em Luisão diante da Turquia no início da trajetória do penta na Ásia. Contra a Suécia em 1990, o Brasil de Lazaroni abriu 2 a 0, mas não foi bem nos 2 a 1. Assim como contra a Coréia do Norte em 2010.

Em 1998, a Escócia deu trabalho nos 2 a 1 do time de Zagallo e o desempenho do "quadrado mágico" formado por Kaká, Ronaldinho, Adriano e Ronaldo contra a Croácia na Alemanha em 2006 foi sofrível na vitória por 1 a 0. O mesmo adversário na abertura da Copa no Brasil com o susto no início com o gol contra de Marcelo e dependendo de Neymar para construir a virada por 3 a 1.

Resultado e desempenho sólido apenas no tetra em 1994 nos Estados Unidos: 2 a 0 com autoridade sobre a Rússia, gols de Romário e Raí. Na maioria dessas vitórias sofridas, atuações piores que a da estreia na Rússia. Mas o desespero resultadista de torcida e imprensa vai criar um ambiente de pressão e cobrança desproporcional para a segunda rodada da fase de grupos. Por causa de um empate que, mesmo com todos os problemas, tivesse se transformado em três pontos seria tratado com alívio como "vitória sofrida". Chances não faltaram.

É do jogo. Cabe ao Brasil de Tite tirar a pressão do primeiro jogo e vencer Costa Rica e Sérvia. Para manter a tradição de passar da fase de grupos desde 1966. Mas principalmente evoluir o desempenho para chegar forte na hora de decidir.

(Estatísticas: FIFA)

Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.