Onde há fome de Champions, lá está Cristiano Ronaldo
O fim da relação entre Cristiano Ronaldo e Real Madrid é a prova de que até os casamentos mais bem sucedidos passam por desgastes. Os mortais, os comuns normalmente aceitam uma vida sem o desafio da conquista diária. Colocam outras vantagens, inclusive a estabilidade e a ciência das virtudes e defeitos da parceria.
Não para Florentino Pérez, certamente incomodado pela falta de negociações nas últimas janelas de transferências por conta da sede de entrosamento e sintonia de Zinedine Zidane. Bi da Liga dos Campeões repetindo a escalação em duas finais, algo inédito. Mais ainda para um clube comprador e um presidente viciado em times galácticos.
Muito menos para o CR7. Competitivo em tudo. Quer sempre o topo. Dos prêmios individuais, da artilharia, entre os mais bem pagos. Também quer ser amado. E os aplausos da torcida na Arena Juventus depois de seu gol antológico de bicicleta certamente pesaram na hora de escolher a Juventus. Ainda que seja um negócio de 105 milhões de euros por um jogador de 33 anos.
Ou melhor, um atleta. De força inesgotável, foco inigualável. Treinamento, alimentação, repouso, força mental. Tudo cuidado com profissionalismo, sem concessões. Gestão de carreira impecável. Para seguir no mais alto nível até quando for possível – e como é difícil imaginar até quando isto vai durar com tamanha disciplina e uma estupenda mentalidade vencedora.
Acima de tudo, para continuar vencendo o principal torneio de clubes do planeta. O grande trunfo na disputa pelo prêmio de melhor do mundo. Está claro que Cristiano Ronaldo quer desenhar uma história única na Champions. Ser o maior vencedor e por clubes diferentes para que ninguém duvide que a força está com ele, não com o time. Ainda que o atacante cada vez mais dependa dos companheiros para decidir com sua ímpar capacidade de concluir as jogadas.
Mesmo para o gigante Real Madrid de 13 títulos será difícil manter o espírito competitivo depois de um tricampeonato. O tetra pode até vir, mas em um elenco renovado, com protagonistas querendo acrescentar a conquista no currículo. Com Ronaldo ficaria a impressão de uma fé no "piloto automático" que não existe no mais alto nível.
Foi assim na saída do Manchester United sem forças para rivalizar com o Barcelona de Guardiola e Messi e já caminhando para o fim da Era Alex Ferguson. Na época, o Real estava há sete temporadas sem vencer a Champions e encarava uma sequência de eliminações nas oitavas de final. Ele chegou e reescreveu a história.
Agora a escolha do português não podia ser melhor. A Juventus rica e estruturada, mas já saturada de conquistas nacionais com um hepta da Série A italiana vai focar tudo na Liga dos Campeões que não conquista desde 1996. A presença de Ronaldo e toda a visibilidade embutida aumentam o poder de atrair outros talentos, incluindo colegas de Real. Difícil até vislumbrar uma formação titular de Massimilano Allegri com a nova estrela.
É óbvio que é impossível prever se haverá química entre craque, clube e companheiros. Os títulos podem demorar um pouco, como aconteceu em Madri. A saída de Buffon é baixa importante, na história e no vestiário. Mas em tese a presença de alguém tão vencedor vai estimular o crescimento de todos, especialmente Dybala. Falta ao argentino de 24 anos a chama que sobra no maior artilheiro da história da seleção portuguesa e do Real Madrid.
Para quem ama o esporte, fica o "luto" pelo fim da maior rivalidade local de todos os tempos entre gênios de uma mesma época. Messi e Cristiano Ronaldo disputando a mesma liga nacional com dois duelos garantidos por temporada em gigantes como Barcelona e Real Madrid. Um roteiro de filme. Acabou. Pelo menos não haverá remorso de quem curtiu cada embate sem a preocupação de ficar desqualificando um para exaltar o outro.
Buffon partiu lamentando que o CR7 tivesse encerrado por duas vezes o sonho continental da Velha Senhora. Agora o gênio da grande área do século 21, de impressionantes 451 gols em 438 jogos no time merengue vai se testar em Turim. Porque onde há fome de Champions, lá está Cristiano Ronaldo.
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