Red Bull Bragantino: um projeto que não deveria incomodar tanto
A Internacional de Limeira, campeã paulista de 1986, foi a grande referência da família Abi Chedid para fazer do Bragantino o melhor time do interior de São Paulo no final daquela década. Rica e bem relacionada na política e nos esportes, foi atrás de bons negócios para montar um time competitivo sem gastar fortunas.
Manteve a base campeã da segunda divisão estadual em 1988 e trouxe Vanderlei Luxemburgo da Arábia Saudita. Impressionada com a personalidade do treinador, aceitou entregar o time principal para quem, a princípio, seria contratado para comandar o time de juniores (sub-20). Uma decisão um tanto aleatória, de pagar para ver.
E veio o "negócio da China" que arrumou a equipe: em 1989, o "impulsivo" Beto Zini, então presidente do Guarani, fez uma profunda reformulação no elenco vice-campeão paulista do ano anterior e trocou Gil Baiano, Mauro Silva, Júnior, Mário e Zé Rubens, mais uma quantia em dinheiro, pelo zagueiro Victor Hugo. Com Tiba do Vasco; Silvio, João Santos e Franklin do Fluminense e Mazinho do Paraná, o time de "refugos" estava pronto.
Assim foi semifinalista do estadual e campeão da Série B nacional. Em 1990, campeão paulista. No ano seguinte, sem Luxemburgo, que saiu para realizar o sonho de comandar o Flamengo, time de coração, chegou ao vice-campeonato brasileiro sob o comando de Carlos Alberto Parreira, que assumiria a seleção no ano seguinte.
Uma daquelas histórias bem brasileiras de sucesso efêmero no futebol. Como o Bangu, de Castor de Andrade e o dinheiro do jogo do bicho na primeira metade dos anos 1980, também com um vice do Brasileiro em 1985. Casos tratados com romantismo e saudosismo por muitos, que não davam tanta importância para a origem dos recursos. Mas quando é uma empresa com projeto sério e a médio/longo prazo, logo torcem o nariz.
A Red Bull tem clubes na Alemanha (Leipzig), Áustria (Salzburg) e Estados Unidos (New York). Investe em estrutura, organização na gestão e na formação de um time com jovens para retorno técnico imediato e potencial venda futura. Agora acredita no Bragantino, ainda ligado à família Abi Chedid – Marco é o presidente, Jesus o prefeito de Bragança Paulista.
Sim, o mais correto seria a Red Bull Brasil trabalhar a longo prazo e buscar os acessos desde a Série D com o próprio time de futebol, mas não há nada ilegal ou imoral no negócio. Ainda mais em um país com história de clubes sustentados por mecenas e "parcerias" mais que questionáveis. Ou times fortes sem orçamentos para sustenta-los.
A contratação bem encaminhada de Artur, que estava emprestado ao Bahia pelo Palmeiras, é um símbolo do que o Bragantino pretende em 2020, tanto no Paulista quanto no retorno à Série A do Brasileiro. Mesmo com a conturbada saída do treinador Antonio Carlos Zago para o Kashima Antlers, o que deve fazer o clube buscar um profissional estrangeiro.
Um planejamento de crescimento sustentável, a princípio sem funcionar como "filial" dos demais clubes. Inclusive dentro do campo. Segundo o CEO Thiago Scuro, em entrevista ao podcast "Triangulação" que este que escreve divide com os colegas Eugenio Leal e Rodrigo Coutinho, a linha de trabalho é semelhante, mas sem rigidez: "O modelo de jogo pertence ao treinador. O que fizemos nos últimos anos no Red Bull foi buscar profissionais com pensamentos similares à ideia do clube no mundo todo", explicou Scuro.
A ideia central é de uma equipe intensa, porém versátil. Capaz de trabalhar a bola para abrir defesas, mas investindo forte em rápidas transições ofensivas. Definir a maneira de jogar facilita a busca de atletas com características que se encaixem no modelo, entre outras decisões no departamento de futebol.
Bi da Série B em 2019, com meta inicial realista e compreensível de permanência na primeira divisão em um retorno. Mas fica claro que o projeto esportivo é ambicioso. Entendendo os processos, sem fé em "milagres" e acreditando em trabalho. Mesmo provocando um certo incômodo pelas mudanças em escudo e uniformes.
Um caminho que costuma dar muito certo e por longo tempo. Não um brilho esporádico e circunstancial, como há trinta anos. Por isso não deveria incomodar tanto.
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