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Palmeiras de Cuca joga em função do rival. Por isso sofre mais fora de casa

André Rocha

01/06/2016 08h40

Nos anos 1980 e 1990 era prática comum no Brasil os treinadores comandarem coletivos armando o time reserva o mais semelhante possível ao adversário para exercitar sua equipe.

O primeiro registro histórico de um técnico preocupado em estudar taticamente o oponente foi de Herbert Chapman no Arsenal nos anos 1930. O inventor do "WM" tinha uma maneira de jogar, mas adaptava o plano ao que esperava do outro lado.

Com o tempo, alguns passaram a mudar a escalações para anular virtudes e explorar deficiências. O "gioco" italiano ou zona mista, muito comum nos anos 1970 e tática utilizada pela seleção italiana campeã mundial em 1982, combinava marcação individual, líbero e posicionamento para fechar espaços.

Nos últimos oito anos, a marcação por zona com compactação, fechando linhas de passes e pressionando o condutor da bola passaram a ser a tônica. Um plano que tem como referência a bola e o espaço, não o jogador.

Obviamente, o estudo do adversário é cada vez maior, com dados detalhados até a essência pelos centros de análise de desempenho e estatísticas. Mas não para montar o time em função disso e sim pensar no modo mais prático e inteligente de impor seu estilo.

Em 2016, Cuca tenta adicionar conceitos atuais à sua maneira de jogar. No entanto, ainda persiste na ideia de montar o time a cada jogo, de acordo com o rival. Na coletiva de sexta-feira ressaltou o treinamento da formação titular diante da reserva parecida com a habitual do São Paulo.

Como ainda acredita na marcação por encaixe ("cada um pega o seu"), monta o time para jogar fora de casa preocupado em se defender e responder com transição ofensiva rápida. Em casa, o mesmo princípio de trabalhar pensando no "interlocutor", porém com a intenção de pressionar e atacar os pontos fracos do sistema defensivo. Ou seja, em casa se impõe, fora apenas reage à proposta do adversário.

É uma escolha, legítima. Mas para definir padrão e ideia de jogo fica mais complicado com esse trabalho caso a caso, jogo a jogo. Requer tempo para os comandados se acostumarem à essa adequação. Além disso, sugere aos seus atletas que longe de casa a primeira meta é não perder.

No Choque-Rei de domingo, a estratégia daria certo se Alecsandro tivesse acertado a cabeçada e a vantagem no placar deixasse a disputa ainda mais à feição do Palmeiras. Quem abriu o placar, porém, foi o São Paulo, com Ganso.

No lance, o volante Thiago Santos está aberto à esquerda, quase como terceiro zagueiro para permitir que Zé Roberto saísse para bater com Bruno e tentar evitar o cruzamento. O encaixe não funcionou e o camisa dez tricolor infiltrou livre, aproveitando falha de Thiago Martins para marcar de cabeça.

No gol da vitória do São Paulo, Zé Roberto não evitou centro de Bruno, o volante Thiago Santos estava pela esquerda na cobertura do lateral e a marcação desencaixou. Ganso entrou livre e aproveitou falha de Thiago Martins (reprodução TV Globo).

Precisando atacar, a equipe armada para defender e contra-atacar se perdeu e o time de Edgardo Bauza poderia ter aplicado uma goleada. Mesmo sofrendo gol aos onze minutos de jogo e tendo mais de 80 para propor o jogo, terminou com menos posse e finalizações que o rival. Pouco para quem tinha um tabu de 14 anos para quebrar no Morumbi.

Cuca sofreu em jogos fora até em seu trabalho mais vencedor: o Atlético Mineiro que conquistou a Libertadores em 2013 precisando desde as quartas-de-final reverter no Independência as derrotas longe de Belo Horizonte. "Galo Doido" em seus domínios, time acuado como visitante. Na campanha do Brasileiro no ano anterior, o título escapou pelo baixo rendimento fora.

Mesmo no clube atual, revés diante do Nacional na estreia de Cuca e empate com o Rosário Central. Ainda que necessitando de vitórias para alcançar a classificação que não veio. Era início de trabalho, mas o perfil já ficou claro. A derrota para a Ponte Preta no Moisés Lucarelli teve outro contexto no desempenho, mas o placar ajuda a reforçar a tese.

Futebol não é matemática, mas tem alguma lógica. O sofrimento do Palmeiras de Cuca sem o Allianz Parque – ou o Pacaembu que receberá o jogo contra o Grêmio na quinta-feira – não é acaso. Apenas uma ideia pedindo atualização. Ainda mais para um postulante ao título, segundo o próprio treinador.

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Sobre o Autor

André Rocha é jornalista, carioca e blogueiro do UOL. Trabalhou também para Globoesporte.com, Lance, ESPN Brasil, Esporte Interativo e Editora Grande Área. Coautor dos livros “1981” e “É Tetra”. Acredita que futebol é mais que um jogo, mas o que acontece no campo é o que pauta todo o resto. Entender de tática e estratégia é (ou deveria ser) premissa, e não a diferença, para qualquer um que trabalha com o esporte. Contato: anunesrocha@gmail.com

Sobre o Blog

O blog se propõe a trazer análises e informações sobre futebol brasileiro e internacional, com enfoque na essência do jogo, mas também abrindo o leque para todas as abordagens possíveis sobre o esporte.